sexta-feira, 17 de junho de 2011

Sexo feminino ou masculino? Nenhum dos dois


Norrie May-Welby, um escocês de 48 anos radicado na Austrália, tornou-se a primeira pessoa de que se tem notícia a ser declarada como não sendo nem homem nem mulher. Ele nasceu menino, passou a tomar hormônios femininos aos 23 anos e fez uma cirurgia para mudar de sexo, mas não se sentiu confortável depois das transformações todas e hoje se vê como uma pessoa sem gênero, simplesmente.

O governo do estado australiano de New South Wales, onde Norrie vivia, recorreu do primeiro registro que ele havia conseguido, com o argumento de que este não poderia conter nenhuma outra opção além de sexo masculino e sexo feminino. O escocês apelou então à Comissão Australiana de Direitos Humanos, que lhe deu vitória e validou o registro.

Faltam estatísticas sobre esta questão, mas especialistas afirmam que o número de pessoas que não se enxergam em nenhum dos sexos vem crescendo - apesar de ainda ser pequeno. Há desde indivíduos que fazem a cirurgia de mudança de sexo mas não conseguem se libertar totalmente das experiências que viveram quando pertenciam ao outro gênero até pessoas que vêem a sua identidade de gênero como fluida. "Para alguns, isso acaba se tornando até uma forma de protesto, visto que o gênero é um princípio organizador muito forte na nossa sociedade", acredita Walter Bockting, professor associado e psicólogo clínico na University of Minnesota Medical School e estudioso da transexualidade desde 1986. "O gênero se desenvolve no plano biológico e, em paralelo, também no psicológico. Você não consegue detectar a que gênero pertence uma pessoa baseando-se apenas em evidências físicas, não sempre. Você precisa perguntar a algumas pessoas com qual gênero elas se identificam. Nesse sentido, estamos diante da porção psicológica do gênero", explica ele.

O escocês Norrie May-Welby, gênero indefinido
Em entrevista à revista Veja em janeiro deste ano, a transexual Lea T., nascida Leandro, disse: "Mesmo com a cirurgia, eu nunca vou ser mulher. E também não serei homem. Eu vou ser sempre o do meio". Filha do ex-jogador de futebol Toninho Cerezo, a modelo Lea tem 30 anos e faz tratamentos hormonais há cinco. Ela passou também por psicoterapia. Se a Justiça de Milão, onde vive, concordar, ela passará em março deste ano pela cirurgia de mudança de sexo e terá todos os seus documentos modificados. Lea se sente mulher desde criança. Andava nas pontas dos pés e pendurava camisetas na cabeça nas brincadeiras, para sentir que tinha "cabelão".

Até mesmo o quadrinista Laerte Coutinho foi recentemente alvo de imensa curiosidade e de várias reportagens por estar se vestindo de mulher (http://moda.ig.com.br/modanomundo/ser+mulher+e+muito+caro/n1237812404702.html), com direito a pintar as unhas dos pés de vermelho. Ele não é gay, não toma hormônios e não pensa em fazer qualquer tipo de intervenção cirúrgica. Laerte entrou para o grupo dos chamados crossdressers; apenas quis "borrar" um pouco as fronteiras entre o masculino e o feminino.

Mesmo estes casos, por assim dizer, mais "normais" de incongruência de gênero desafiam preconceitos ainda bastante arraigados na sociedade. "É absolutamente impossível que seis bilhões de pessoas possam ser divididas em dois grupos", sentencia Jack Drescher, da American Psychiatric Association (APA). Todas estas histórias mostram que precisamos, no mínimo, repensar os nossos conceitos sobre gênero.

Foto: W. Peeters / Sydney Morning Herald

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